Uma passagem da rua para casa

Localização Angola
Responsável Centro de Acolhimento de Crianças Arnaldo Janssen

O regresso da guerra a Angola, após as eleições de 1992, encheu as ruas de Luanda de milhares de crianças. Umas, vítimas de violência doméstica; outras, à procura de um refúgio para escapar à violência e à pobreza extrema. A maior parte acabou por viver na rua, em carros abandonados, casas arruinadas ou na praia. Todas têm histórias de dor para contar. Todas sonham voltar a casa. O Centro Arnaldo Janssen, nascido em 1993 por iniciativa do padre Horacio Caballero e um grupo de voluntários, procura ajudá-las a concretizar este sonho.

Nas ruas de Luanda

Vista da fortaleza de São Miguel, a cidade de Luanda parece revestida de magia. Contudo, à luz do entardecer, a beleza da cidade reflectida na baía esconde outra realidade. Nas suas ruas há recantos onde pequenos grupos de crianças e jovens procuram refúgio para passar a noite.

O Anselmo, assistente social no Centro Arnaldo Janssen, e o Irmão Facatino começam mais uma ronda nas noites de Luanda. Dirigem-se a sítios já conhecidos onde se costumam concentrar os meninas da rua. A primeira paragem é numa zona da Baixa. Imediatamente um grupo de rapazes, entre os oito e os quinze anos, aproxima-se deles. Reconhecem-nos, saúdam-nos. A esta hora, já estavam a preparar-se para dormir, no chão, entre uma estrada escura e um muro.

Todos ouviram falar do Centro de Acolhimento; alguns já por lá passaram. Outros conhecem amigos que estão lá. Estes, porém, ainda não decidiram dar o passo para sair da rua. Têm saudades de uma casa? Têm, mesmo quando tiveram de fugir porque eram maltratados.

Só quando a noite cai é que se reúnem junto a este muro. Durante o dia andam pela cidade, com um único objectivo: conseguir algo para comer. Lavam carros, carregam mercadorias e, dizem-nos – em palavras não ditas e gestos codificados – que também arranjam dinheiro vendendo droga ou furtando.

As equipas não obrigam ninguém a ir para o Centro de Acolhimento. A liberdade para deixar a rua é um valor a preservar. É preciso muita paciência, traduzida em muitas noites de presença e de conversa, para que algum dê o primeiro passo em direcção à mudança. “A noite está fria”, dizem alguns dos mais novos. “No Centro há um tecto e cobertores,” recorda o Anselmo. Prometem passar lá um dia destes.

Do outro lado da rua, erguem-se luminosos arranha-céus. Quando chove, os meninos encostam-se às paredes para se protegerem da chuva. Às vezes, para limpar a zona, a polícia expulsa-os. Acabam sempre por voltar, porque a rua é a sua única casa.

A segunda paragem da noite é nas imediações da igreja de São Paulo. A rua em frente ainda tem muito movimento. Encostados a um muro, um grupo de crianças prepara-se para fazer do passeio a sua cama, mas é como se fossem invisíveis para os carros de luxo que cruzam a avenida e as pessoas que circulam nos passeios.

Também aqui, o Anselmo e o Facatino deixam o carro e dirigem-se para o grupo. Trocam notícias, ficam ao corrente do que tem acontecido na vida deste ou daquele, alimentam a confiança mútua. Também aqui, nem um só gesto de violência, uma palavra agressiva ou uma falta de respeito da parte dos jovens. É curioso como eles não pedem nem dinheiro, nem comida.
Aliás, a equipa não traz nada a não ser tempo para escutar as suas histórias e um convite para entrarem no Centro de Acolhimento. Felizmente, muitos têm aceitado a proposta. Infelizmente, todas as semanas há caras novas na rua que revelam histórias de violência, abandono e sofrimento. Mas há, também, felizmente, gente que não tem receio de estender a mão, sentar-se nos muros e escutar as suas histórias doridas. Esta noite, nas conversas com os meninos da rua, o Anselmo e o Facatino nunca falaram de Deus, nunca referiram o nome de Jesus. Não era preciso. Era mais do que evidente: Ele é que estava à nossa espera, ajeitando-se para adormecer, numa rua de Luanda.

O Centro Arnaldo Janssen

O Centro de Acolhimento de Crianças Arnaldo Janssen, em Luanda, acolhe crianças de rua. O Centro nasceu em 1993 por iniciativa do padre Horacio Caballlero, missionário do Verbo Divino, das irmãs Danuta Bunko e Erlinda Moron, missionárias Servas do Espírito Santo, e de um grupo de jovens voluntários da paróquia de Cristo Rei, de Luanda.

O regresso da guerra a Angola, após as eleições de 1992, encheu as ruas de Luanda de milhares de crianças que fugiam das áreas de conflito. Muitas tinham sido vítimas de violência doméstica; outras procuravam um refúgio para escapar à violência e à pobreza extrema. A maior parte acabou por viver na rua, em carros abandonados, casas arruinadas ou na praia. O Centro Arnaldo Janssen nasceu para responder a esta situação.

No início, o Centro possuía apenas barracas provisórias, na ilha de Luanda. Em 1994, a arquidiocese de Luanda ofereceu um terreno, onde se ergue a sede actual, no bairro do Palanca. O Centro tem como objectivo reintegrar as crianças e os jovens nas suas famílias e na sociedade de onde saíram pelas mais diversas razões. Depois de contactadas na rua, as crianças que desejam ser inseridas no programa de ajuda são acolhidas no Centro. Ali são educadas nos valores da cidadania, com os direitos e deveres que ela comporta. Têm formação escolar, religiosa e profissional e recebem assistência médica.

Um lar temporário

O coordenador do sector da educação, Angelo Kachimbamba, o irmão João Facatino, SVD, e a assistente social Judite dos Santos guiam-nos numa visita ao Centro. Enquanto nos mostram as instalações (dormitórios, refeitório, lavandaria, salas de estudo, enfermaria, recreios...) vão falando sobre o funcionamento e os objectivos deste projecto. Dizem-nos que o Centro acolhe crianças de rua temporariamente, ou seja, o objectivo é conseguir localizar os seus familiares e conseguir a sua reintegração na família e na sociedade. Por isso, algumas crianças permanecem apenas alguns meses no Centro; outras, porém, permanecem vários anos.

O Centro tem capacidade para receber 192 crianças. Neste momento acolhe 130. Enquanto permanecem no Centro, os miúdos vão à escola fora. Alguns dos mais velhos frequentam cursos de formação profissional na área da electrónica, carpintaria e serralharia que são ministrados nas instalações do Centro e são frequentados também por jovens do exterior.

No Centro trabalham cinco pessoas na área da educação, cinco assistentes sociais, duas enfermeiras, quatro funcionárias na cozinha e nove na segurança. Além disso, no Centro trabalham os missionários do Verbo Divino, padres Horácio e Pablo e o irmão João Facatino.

Da rua para casa

Uma vez por semana, à noite, as equipas do Centro visitam “os focos de concentração” de meninos de rua, na cidade de Luanda. São locais conhecidos onde as crianças e os jovens procuram um abrigo para passar a noite. Os elementos das equipas do Centro conversam, retomam pontes estabelecidas anteriormente, procurando sensibilizar os jovens para tomarem a decisão de sair da rua e entrarem para o Centro. Actualmente, estas equipas já não distribuem alimentos ou medicamentos como nos anos mais difíceis. O objectivo principal é sensibilizar as crianças a voltarem para a família, ajudando-as a tomar a decisão de mudar de vida.

As razões da fuga para a rua são as mais diversas, dizem-nos. Uns saíram de casa devidos a maus tratos e violência doméstica; outros para fugir à pobreza; outros porque foram acusados de feitiçaria e tiveram de ir para a rua para sobreviver. Todos têm histórias de dor para contar. Todos sonham voltar a casa. A realidade, porém, muitas vezes impede a concretização desse sonho.

Quando uma criança entra para o Centro, procura-se descobrir o paradeiro da família e, se necessário, começar um caminho de reconciliação familiar. Uma vez localizadas, o Centro também trabalha com as famílias. Às vezes, a criança foi maltratada; é necessário reconstruir a confiança mútua. A criança começa, também, a frequentar a escola. O objectivo é sempre reintegrar o jovem no seio familiar de onde saiu. Depois de contactadas na rua, as crianças que desejam ser inseridas no programa de ajuda são acolhidas no Centro. Ali são educadas nos valores da cidadania, com os direitos e deveres que ela comporta. Têm formação escolar, religiosa e profissional e recebem assistência médica. da rua para casa Todas têm histórias de dor para contar. Todas sonham voltar a casa.

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